Viena, 12/03/2025 – O aumento do tráfico de drogas e de outras atividades ilícitas ligadas ao crime organizado na Amazônia vêm impactando, de forma severa, os povos indígenas da região ao ameaçar a herança cultural, os territórios e um dos ecossistemas mais críticos do mundo.
Nesse contexto, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) no Brasil promoveram, nessa terça-feira (11), o evento Políticas sobre Drogas e Povos Indígenas: Fortalecendo a Resiliência das Comunidades por meio de uma Abordagem Baseada nos Direitos Humanos e no Desenvolvimento Alternativo na Região Amazônica.
A discussão ocorreu durante a 68ª sessão da Comissão de Narcóticos das Nações Unidas (CND, sigla em inglês), em Viena, na Áustria, e teve como objetivo debater práticas inovadoras que possam criar soluções para fortalecer essas comunidades. O encontro paralelo foi copatrocinado pelos governos da Alemanha, da Colômbia, da França e do Peru.
A secretária Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), Marta Machado, defendeu soluções integradas e multidimensionais para enfrentar o tráfico na Amazônia e ampliar a resiliência dos povos indígenas. “As políticas tradicionais de drogas falharam em conter o crime organizado ou proteger comunidades, muitas vezes aprofundaram as desigualdades. A aplicação da lei, por si só, não desmantelará essas redes”, disse.
Ela destacou que o Brasil está comprometido com uma nova política de drogas, que incorpora o desenvolvimento alternativo. “Essa é uma estratégia-chave para resiliência territorial, autonomia econômica e proteção ambiental, adaptada ao nosso papel como um país de trânsito de drogas”, argumentou.
A diretora do UNODC no Brasil, Elena Abbati, citou que o escritório vem trabalhando, nos últimos 4 anos, com oito projetos na Amazônia, e destacou três deles: o Centro de Estudos sobre Drogas e Desenvolvimento Social Comunitário (Cdesc), o Projeto Tapajós e o SAR-TI. “A abordagem de desenvolvimento alternativo está no centro da discussão hoje, especialmente para os povos indígenas que estão em risco particular vivendo em ecossistemas frágeis. A cooperação internacional é, portanto, essencial para enfrentar esses desafios, bem como as parcerias entre os setores público e privado”, enfatizou.
O Cdesc, desenvolvido em conjunto com a Senad e com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), tem participado de audiências com povos indígenas com o propósito de compreender como um projeto de desenvolvimento alternativo poderia ser implementado no Pará (PA) para contribuir na melhoria da cadeia da sociobioeconômica da região, no que diz respeito à política de drogas.
O Projeto Tapajós, por sua vez, busca apoiar iniciativas para enfrentar o trabalho em condições análogas à escravidão e o tráfico de pessoas na mineração de ouro no Pará, por meio de pesquisa, fortalecimento da segurança pública e justiça criminal e desenvolvimento alternativo. Já o SAR-TI, implementado com o apoio da Itália, busca fortalecer os sistemas de alerta precoce para crimes ambientais relacionados à mineração ilegal em territórios indígenas.
Fortalecimento local
Na ocasião, a titular da Senad apresentou a Estratégia Nacional para Mitigação e Reparação do Impacto do Tráfico de Drogas sobre Populações Indígenas, desenvolvida pela pasta. O objetivo da iniciativa é, entre outras ações, garantir que as populações indígenas tenham acesso à assistência jurídica, programas de prevenção às drogas, oportunidades de desenvolvimento sustentável e direitos fundamentais.
A presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, também participou do evento em Viena e destacou o desafio de proteger territórios indígenas brasileiros, especialmente pelo fato de quase metade delas ocupar regiões de fronteira. “Sofremos a grande pressão do crime organizado e temos que proteger áreas com diferentes complexidades. Para isso, precisamos contar com soluções vindas do governo e de organismos internacionais, baseadas em estratégias locais”, afirmou.
O evento paralelo ainda teve a participação on-line do jovem comunicador indígena Tumi Matis, do Vale do Javari. “Sofremos, principalmente, com a questão de álcool e drogas e, muitas vezes, o Estado está ausente em nossas comunidades. Vivemos na segunda maior terra indígena do Brasil, trabalhamos e lutamos para que possamos viver bem no nosso território.”
Experiências internacionais
Além das iniciativas em andamento no Brasil, Colômbia e Peru destacaram suas políticas sobre drogas e abordagens inovadoras para lidar com as vulnerabilidades econômicas e socioambientais enfrentadas pelas comunidades indígenas na Amazônia. Também foram apresentados estudos, recomendações e esforços internacionais sobre o tema, envolvendo a participação da Alemanha e da França.
A política de drogas adotada na Colômbia, por exemplo, tem oito eixos de trabalho, entre eles um específico para atender populações vulneráveis ao mercado e ao tráfico de drogas e um de cuidados com o meio ambiente. “Pela primeira vez na história, faremos uma consulta prévia aos povos indígenas da Colômbia a respeito da política de drogas no país, fazendo um esforço técnico importante, mas com o compromisso ético de compreender as realidades locais”, explicou o diretor de Políticas sobre Drogas e Atividades Relacionadas do Ministério da Justiça e do Direito da Colômbia, Alexander Rivera.
O ministro conselheiro da Comissão Nacional para o Desenvolvimento e Vida sem Drogas do Peru, Carlos Sánchez del Águila, comentou os impactos do cultivo de coca e a importância de se fortalecer a governança territorial. O evento ainda contou com a participação da coordenadora do Cdesc, Bárbara Souto, e da consultora da Parceria Global sobre Políticas e Desenvolvimento de Drogas (GPDPD), Sofia Wahl, além da Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ).
CND
A CND é o organismo central de formulação de políticas sobre drogas dentro do Sistema das Nações Unidas. Além de adotar novas resoluções em nível global, a comissão é o principal espaço de discussão e de análise sobre a situação mundial das drogas, com programação extensa de eventos paralelos temáticos, exposições e reuniões entre gestores públicos, sociedade civil e especialistas de todo o mundo. Nesse contexto, os países têm a oportunidade de pautar o debate, apresentar suas políticas nacionais e avançar na cooperação internacional.
Fonte: Ministério da Justiça e Segurança Pública